nCoV-19 |
Os esforços em busca de um recurso terapêutico eficaz e seguro contra o nCoV-19 estão mobilizando grande parte da comunidade científica mundial. Alguns indicadores preliminares de sucesso se aproximam e nesta postagem vou tratar de um novo fármaco utilizado contra outras viroses (e.g. Ebola) que se encontra em estudos clínicos para o uso no tratamento da SRAS-nCoV-19. Trata-se do rendesivir (RDV, GS-5734), um novo agente antiviral da classe dos análogos de nucleotídeos modificados. É um análogo de adenosina, onde o sistema N-heterocíclico foi substituído por um anel pirrolo-pirimidínico substituído, atuando sobre RNA-polimerase viral.
Este medicamento antiviral foi desenvolvido pela Gilead Sciences (GS), empresa farmacêutica
norte-americana com sede na California, descobridora do oseltamivir (TamifluR),
um fármaco inibidor de neuroaminidase viral que mimetiza o estado de transição
do mecanismo de ação enzimático e que posteriormente foi licenciado para a
Roche e utilizado para o tratamento da influenza (H1N1, H3N2). A GS foi também a
descobridora de outro antiviral inovador, o sofosbuvir (SovaldiR), inibidor
da NS5B polimerase viral, primeiro antiviral com indicação para o tratamento da
hepatite-C que se tornou um blockbuster com vendas mundiais na escala de
bilhões de dólares anuais contribuindo com ca. 20% do faturamento global
da GS, que em 2018, foi de US$ 22,1 bilhões.
O RDV
foi lançado no mercado em 2017, com indicação terapêutica para tratamento da
síndrome provocada pelo vírus Ebola e posteriormente, demonstrou atividade contra
outros vírus de RNA de fita simples como os vírus respiratórios do grupo do coronavírus
(CoV) (e.g. MERS e SARS).
Dada a atividade
anti-CoV do RDV, demonstrada em estudos pré-clínicos, este fármaco foi avaliado
no tratamento de um dos primeiros pacientes com SARS-nCoV-19 nos EUA, utilizado
por administração intravenosa [B. Cao, Mild/Moderate 2019-nCoV Remdesivir RCT –
Texto em: ClinicalTrials.gov
2020]. Os resultados obtidos foram encorajadores e motivaram estudos clínicos controlados
e duplo-cegos com ca. 2700 pacientes adultos, em pelo menos dois estudos
[link;
link],
de maneira a permitir se avaliarem a eficácia e segurança do emprego do RDV, em
pacientes hospitalizados com doença respiratória SRAS-nCoV-19 leve, moderada ou
severa, em internação com e sem respiração mecânica. Os resultados destes
estudos são aguardados para fins de abril com 308 pacientes e para o fim de maio
de 2020, com 2400 pacientes.
O RDV é um pró-fármaco nucleotídico, sendo o produto de
hidrólise da subunidade monofosforamidato de sua molécula, o monofosfato de nucleotídeo
(GS-441524), que uma vez trifosfatado em sua hidroxila primária, representa a
entidade ativa contra CoV, via inibição da RNA-polimerase viral.
Para concluir, vê-se que o RDV, se vier a ser usado para
tratamento da SRAS-nCoV-19, representará mais um exemplo de sucesso da
estratégia de reposicionamento de fármacos (drug repurposing ou repositioning)
e me parece bastante possível que muitas Big-Pharmas possam estar revisitando
“suas” moléculas, inclusive de seus pipelines, para investigar eventuais
efeitos terapêuticos sobre a SRAS-nCoV-19.
Obrigado
por lerem.