Nestes derradeiros dias de 2021, ano de marcas trágicas provocadas pela Covid-19, é alvissareiro saber que a indústria farmacêutica (IF) que se baseia fundamentalmente em Ciência, inventou um fármaco com propriedades anti-SARS-CoV-2.
Este tema me pareceu merecedor desta postagem, por
sua importância e por evidenciar a capacidade inovadora da IF face ao desafio
colocado pela Covid-19.
Figura 1 – Combinação de fármacos do PaxlovidR
A identificação do
nirmatrelvir como um inibidor irreversível de
SARS-CoV-2 MPRO ilustra o uso, com sucesso, de estratégias da
Química Medicinal para a descoberta de um protótipo, sua otimização pelo ajuste
de fatores moleculares capazes de modularem suas propriedades físico-químicas
que regulam a possibilidade de administração oral (e.g. solubilidade aquosa) e
permeação por membranas e sua eficácia, traduzida pela maior afinidade pelo
alvo terapêutico. Neste caso, a partir da estrutura 3D do alvo a proteína CL-MPRO
do SARS-CoV-2, onde se lograram identificar amino-ácidos chaves no reconhecimento
molecular de hits iniciais, como a glutamina (Gln-163) que demonstrou
interagir com uma subunidade pirrolidona presente em alguns hits. A
modificação de unidades peptídicas, alteradas pelo aumento de lipofilicidade
como análogos bicíclicos de prolina, onde o fragmento pirrolidinona foi
incluído em sistemas bicíclicos do tipo 2-azabiclico[3.1.0]hexano dimetilado, viabilizaram
a obtenção de ligantes de maior afinidade e com lipofilicidade ajustada. A modulação
de sítios reativos (warhead) com a Cys-185 da protease viral, variando
entre aldeído, presente em GC373, e modificada para nitrila do nirmatrelvir,
viabilizaram a identificação de ligantes adequados que foram otimizados
consecutivamente, combinando trocas bioisostéricas clássicas de anéis
aromáticos ou pela adoção de scaffolds presentes em outros inibidores de
proteases virais conhecidos. Esta abordagem tipicamente de Química Medicinal
permitiram o uso oral do nirmatrelvir que teve sua posologia melhorada pela coadministração
com o ritonavir, previamente desenvolvido como inibidor de aspartil-protease do
HIV.
A Figuras 2, a seguir,
ilustra a gênese do nirmatrelvir, enquanto que as Figuras 3 e 4 ilustram o
nucleófilo viral, representado pela Cys145 do sítio catalítico e a estrutura do
aduto covalente formado entre o fármaco e a SARS-CoV-2 CL MPRO.
Obrigado por ler.