Voltaire (filósofo francês do século 18) tem inúmeras
frases célebres, algumas demonstrando preocupações com as doenças e suas curas.
Filosofou a respeito dos remédios da época, indagando: “Como morrem os remédios?”.
Refletindo sobre o tratamento dos doentes, escreveu que “...a arte da Medicina consiste
em distrair o paciente, enquanto a Natureza cuida da doença”. Em seu tempo enunciou
uma definição para aqueles profissionais: ”Os médicos são homens que prescrevem
remédios sobre os quais eles pouco conhecem, para curar doenças sobre as
quais sabem menos ainda, em seres humanos sobre os quais não sabem nada”.
Em
sua biografia, há registros de que Voltaire tinha uma precária saúde, o que
poderia ter sido sua motivação para dar atenção às doenças e seus doentes.
Traçando-se um paralelo entre aquele momento, em que vivia o filósofo e o atual,
se nos propuséssemos a atualizar aquelas definições, fazê-lo seria tarefa
simples. Ao contrário, pois em nossos dias, se o binômio doença-doente já foi
ultrapassado, o direito constitucional à Saúde ainda não foi universalizado entre
nós.
Atualmente, considera-se que as políticas públicas
de Saúde devem visar sua preservação, manutenção, promoção e correção. Para
tanto, é preconizado o uso seguro e racional dos medicamentos,
denominação atual para os “remédios” de Voltaire. De fato, em nosso
idioma, remediar indica ato paliativo, distante de curar, missão maior dos medicamentos
contemporâneos. Assim que, embora o uso popular do termo remédio, tenha
se vulgarizado e em muitas ocasiões seja empregado como sinônimo de medicamento,
nenhum profissional da saúde deve promover este malfeito, falando “remédios”
ao referir-se aos medicamentos!
Pode parecer curioso que Voltaire se tenha preocupado com o uso dos remédios,
tendo sido um filósofo. Na verdade, não é tanto assim. Machado de Assis, nosso
ilustríssimo e genial escritor do século 19, também escreveu sobre os remédios
de sua época. O fez na pele de Brás Cubas, em seu “As memórias póstumas de Brás Cubas” quando escreveu sobre os pensamentos
de seu principal personagem, ao almejar algo mais para a humanidade de seu
tempo: “"Nada menos que a invenção de um medicamento sublime...”,
que segundo o personagem deveria ser “...capaz de aliviar nossa melancolia”, para
merecer aquela classificação.
Passando pelos séculos 18, 19 e chegando-se ao 20, podemos detectar diversas
alusões aos medicamentos em vários textos, como instrumentos efetivos - quando utilizados na
posologia prevista – para a manutenção, promoção, preservação e correção de
nosso estado de saúde. Naquele século 20, ainda próximo, surgiram a maioria dos
medicamentos utilizados na medicina contemporânea, iniciando-se pelo uso
do ácido acetil salicílico (AAS), medicamento que surgiu ao apagar das
luzes do século 19 (1989) e tornou-se um dos mais famosos acetatos terapeuticamente
uteis. Afinal, naqueles tempos se acetilava tudo que fosse acetilável, pois era
uma transformação química banal, pela facilidade de se terem derivados do
vinagre. Nasceu e cresceu o AAS e mesmo sendo um fármaco centenário, adquiriu indicações
modernas, diversas das originais de mero analgésico, antitérmico.
Já
escrevi neste blog sobre os “acetatos famosos”, ressaltando o AAS como
uma molécula “Nobelista”, pois a elucidação de seu mecanismo farmacológico de
ação, ocorrida várias décadas depois, contribuiu
para o prêmio Nobel de Medicina e
Fisiologia em 1982, a três pesquisadores: John
R. Vane (UK), Bengt I. Samuelsson e Sune K. Bergström (SE).
Ao
finalizar, cabe uma reflexão: tivesse sido hoje sua descoberta, o AAS, possivelmente,
nunca teria se tornado um medicamento, pois sem o mecanismo de ação
conhecido, nenhuma empresa farmacêutica se interessaria.
Se
tivesse sido assim, teríamos tido menos três Nobelistas ...?
Feliz Páscoa!
Obrigado por lerem!!!