A questão da inovação terapêutica volta
à tona e diversas recentes publicações em prestigiosas revistas científicas
registram os fortes sinais de recuperação da Big Pharma, que teve, em 2012, 33 novas aprovações pela agência
regulatória norte-americana (Food and
Drug Administration; FDA), alcançando os índices de 2003. Lendo uns e
outros autores, aqui, ali e acolá, tenho observado que há uma grande
redundância no pipeline das grandes
empresas farmacêuticas que inventam fármacos. Assim é quase como um modismo, do
tipo: “se eles fazem, nós também temos de
fazer” que podemos entender a convergência de esforços de diferentes
empresas farmacêuticas por uma mesma abordagem, para identificarem novos
fármacos para determinada indicação terapêutica. Vários são os exemplos, nesta
nova classe terapêutica, dos esforços de pesquisa da indústria farmacêutica
realizados por associações ou contratos de joint-venture. As parcerias reduzem os
prejuízos de cada empresa associada, em caso de eventuais insucessos, sobretudo
em projetos considerados de maior risco e talvez comprovem a cautela que passou
a nortear as atividades de pesquisa na IF.
Nesta vigésima segunda postagem vamos
tratar de uma nova classe de fármacos desenvolvidos para tratamento e controle
da diabetes tipo-2, com indicação de uso associada à realização de exercícios
físicos com orientação profissional e dieta controlada. Trata-se dos inibidores
do co-transportador de glicose e sódio 2 (sodium-glucose
co-transporter 2; SGLT2), que representa um novo
mecanismo farmacológico de controle da taxa de açúcar no sangue.
Estes fármacos que podemos denominar gliflozins são autênticas inovações inovadoras, isso mesmo,
“inovações inovadoras”, pois são substâncias inéditas, com fragmentos
moleculares compreendendo subunidade tri-hidróxipirana conectada a um sistema
benzílico substituído e atuam, no controle da glicose sanguínea, por
mecanismo farmacológico de ação original. São, portanto, merecedores da
redundância. Esta nova classe
terapêutica, ilustra muito bem uma das novas estratégias adotadas pela Big Pharma para a cadeia de inovação
radical em fármacos, visando superar a recente crise diagnosticada por inúmeros
e distintos especialistas. Estas ações de inovação aberta, se fazem através alianças entre grandes empresas
e, ao mesmo tempo, ilustram o acirrado nível de competitividade e rivalidade entre
as empresas farmacêuticas que inventam fármacos inovadores. Para compreender
bem esta realidade basta identificar a similaridade molecular existente entre os
fármacos desta classe ilustrados na Figura.
Se
considerarmos as estruturas químicas do dapagliflozin e do empagliflozin, observamos
uma similaridade molecular gritante, representada pela presença dos fragmentos tri-hidróxipirana,
emoldurado por azul e do sistema benzílico funcionalizado (em laranja), além do
anel fenoxílico para-substituído. A
semelhança estrutural dentre estes fármacos cessa apenas na natureza do
substituinte alquila do éter de fenol para-substituído
(A) terminal, ressaltando-se que até
o átomo de halogênio do sistema benzílico é o mesmo, nas mesma posição do anel.
Todos os fármacos descritos na Figura, possuem elevada semelhança estrutural
pois se observarmos o canaglifluzin, detectamos a presença de um anel tiofênico
(B) conectado ao sistema benzílico
substituído, isóstero do anel fenila presente no empaglifluzin, dapaglifluzin,
tofoglifluzin e luseoglifluzin. No ipraglifluzin houve a fusão do anel
tiofênico do canagliflozin com o grupo fenila substituído, resultando num anel
aromático benzotiofênico. As demais variações estruturais nesta classe são singelas
e sugerem que um grupamento farmacofórico desta classe, reside na unidade
tri-hidróxipirana ou tri-hidróxi-tetraidro-2H-tiopirana,
esta última presente no luseoglifluzin.
Outrossim, as estruturas químicas dos
fármacos ilustradas na Figura, além de comprovarem a capacidade da IF em
desenvolver me-too com extrema agilidade,
atestam a adoção da estratégia de parcerias, pois o empagliflozin foi desenvolvido
por uma parceria entre Boehringer Ingelheim e Eli Lilly e encontra-se em fase
de estudos para aprovação de uso pelas agências americanas e européias. Por sua
vez, o tofoglicofluzin foi resultado de associação entre a empresa japonesa
Chugai e a Sanofi, enquanto que o ipraglicofluzin, rivalizando com todos, é
resultado de parceria entre Astellas e Kotobuki Pharmaceutical e teve seu
dossiê depositado para apreciação pelas agências européia e japonesa, em março
de 2013.
Em novembro de 2012, foi aprovada na
agência regulatória européia o dapagliflozin (ForxigaR), também desenvolvido
em parceria desta feita entre AstraZeneca e Bristol-Myers Squibb. Apresentando
efeitos adversos que favoreciam infecções
genito-urinárias, pancreatite e maior risco cardiovascular (CV), este primeiro
inibidor de SGLT2 foi rejeitado pelo FDA, por falta de segurança em seu uso. Entretanto,
em 29 de março de 2013, esta agência regulatória aprovou o canagliflozin
(InvokanaR), desenvolvido pela Janssen/J&J que representa o
primeiro fármaco desta classe aprovado pela agência norte-americana como autêntica
inovação terapêutica capaz de melhorar a condição de milhões de pacientes com
diabetes tipo-2, doença crônica que pode
trazer severas complicações provocadas pela elevação da taxa de açúcar no
sangue, tais como lesões renais ou do sistema nervoso central, além de cegueira
e eventuais danos cardíacos.
Obrigado por lerem.