Como sabemos, não raramente, estruturas originais podem esconder mecanismos farmacológicos inéditos, uteis para o controle de diversos quadros fisiopatológicos. A epibatidina, foi isolada por John W. Daly e colaboradores, em 1974, da glândula lateral de um sapo equatoriano (Epipedobates tricolor). Após árduos estudos sua estrutura química foi elucidada em 1992, evidenciando sua similaridade molecular com a nicotina, substrato natural dos receptores nAChR e mAChR. Inúmeras rotas sintéticas surgiram, confirmando de forma inequívoca sua estrutura química que representou o primeiro alcaloide piridínico clorado isolado.
Este produto natural demonstrou potente propriedades analgésicas,
superando largamente a potência da morfina. Este poderoso perfil analgésico,
motivou vários estudos, especialmente nos laboratórios da Abbott, nos Estados
Unidos, visando otimizar seletivamente seu perfil analgésico, que resultaram na
tebaniclina (ABT-594), substância 200 vezes mais potente que a morfina. Esta
estrutura química possui como principal peculiaridade, a presença de um
heterocíclo de quatro membros, nitrogenado, azetidina, mimetizando o anel
pirrolidínico presente na nicotina, substrato natural do nAChR, onde atua. A
gênese da tebaniclina pode ser entendida pela análise da figura abaixo. A
epibatidina foi objeto de duas “dissecações” moleculares. A primeira a, pela
simplificação molecular do seu sistema azabiciclo[2.2.1]heptano, eliminando os
metilenos cíclicos em azul na figura, o que originou o anel pirrolidínico (em
vermelho) do composto ABT-291, que preserva o fragmento molecular
cloro-piridina, mas sendo ainda muito semelhante estruturalmente à nicotina,
não apresentou o perfil seletivo desejado. A segunda modificação molecular da
epibatidina (b na figura), resultou da cisão da ligação C2-C3
do seu sistema biciclíco, criando uma unidade espaçadora de dois átomos. Um destes
átomos de carbono foi isostericamente trocado por um átomo de oxigênio,
resultando em um éter substituindo a posição 5 do anel piridínico-clorado do
composto ABT-381. Os esforços de pesquisa, liderados por Halladay e
colaboradores na Abbott, conduziram ao ABT-594, quando empregaram a estratégia
de contração de anel, homólogo inferior, reduzindo o anel pirrolidínico (5
membros) para um ciclo azetidínico de quatro membros. Como curiosidade, ambos
os enantiomêros deste composto mostraram-se ativos e equipotentes, atuando como
agonista parcial dos receptores nACh, com potência da ordem de 0,04 nM,
interagindo com este GPCR através das sub-unidades a4b2 e a3b4. Na etapa 2 dos estudos clínicos, observaram-se severos efeitos sobre
o trato gastro-intestinal o que levou a Abbott a suspender seus estudos
clínicos, abortando o desenvolvimento desta substância como analgésico para a
dor neuropática, doença ainda sem tratamento eficaz.
Nesta data, desejo muitas alegrias às mães neste seu domingo.
Obrigado
por lerem.