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quinta-feira, 1 de outubro de 2015

A Química Medicinal propriamente dita


             Nesta nossa quadragésima sexta postagem vou tratar de algo que me tem provocado intensa reflexão, recentemente. Refiro-me à qual deve ser a missão primordial da Química Medicinal, propriamente dita! Talvez redundância se faça necessário para reforçar o sentido do que pretendo dizer.

             Existem inúmeras definições na web e em diversas fontes bibliográficas credibilíssimas que atestam a primordial missão da Química Medicinal. Não vou entrar em juízos comparativos, para não chover no molhado, mas o que de fato interessa nesta disciplina interdisciplinar é a invenção de novos fármacos.  Tarefa árdua, sem dúvida, repleta de riscos de insucesso, imensamente superiores às diminutas perspectivas de êxito, em termos pessoais, mas que objetiva contribuir para com o arsenal terapêutico contemporâneo com novos fármacos eficazes e seguros para o tratamento e cura dos males que nos afligem. Não menciono, para não ampliar nem sombrear demais o foco principal, os elevados custos associados a esta atividade de inovação tecnológica, eminentemente baseada em Ciência. Poderia ainda citar alguns gargalos tecnológicos que teimam em existir no Brasil, neste importante setor industrial farmacêutico, mas isso per-se já seria tema para outra postagem. Quem tiver interesse pode consultar estes dois artigos recentes que publicamos: Barreiro, E. J.; Pinto, A. C.; Oportunidades e Desafios para a Inovação em Fármacos: Agora ou Nunca !, Rev. Virtual Quim. 2013, 5 (6), 1059-1074 (http://www.uff.br/rvq); Pinto, A. C.; Barreiro, E. J.; Desafios da Indústria Farmacêutica Brasileira, Quim. Nova 2013, 36 (10), 1557-1560 (Química Nova).
 


 
 
             Assim sendo, resto-me ao ponto principal: sem Química Medicinal não é possível inventarem-se fármacos! Melhor: os novos fármacos passam, indelebilissimamente (i.e. mais do que obrigatoriamente), pela Química Medicinal. Aquela propriamente dita! Aquela que tem Química! Aquela que compreende o destino do fármaco, enquanto princípio ativo (PA) do medicamento na biofase. Aquela que antecipa as razões moleculares dos efeitos terapêuticos desejados, dose-dependentes, ao mesmo tempo que entende as distintas contribuições moleculares de todos os fragmentos presentes na molécula do PA. Aquela que racionaliza, antecipadamente, os riscos moleculares associados a presença no PA de subunidades estruturais com propriedades químicas favoráveis à farmacocinética adequada e desprovidas, se possível, de toxicidade. Aquela que a partir daí pode intervir modificando racionalmente a estrutura química para otimizá-la, quanto a sua druggability. Estas “aquelas” é a Química Medicinal, propriamente dita!
            Não foi por nenhuma outra razão, além da defesa destes fundamentos, que quando consultado, recentemente, pela Divisão de Química Medicinal da American Chemical Society, em enquete feita com todos os seus membros ativos, sobre a troca de nome da Divisão, opinei pela manutenção de Química Medicinal!
 
            Não me entendam mal! Não esqueci que a invenção de novos fármacos não é uma tarefa individual possível. Precisa-se de uma equipe multidisciplinar de profissionais com habilidades científicas complementares, harmonicamente organizados, articulados, sintonizados e imbuídos de objetivo comum: o novo fármaco! Entre estes profissionais, o Químico Medicinal é indispensável!
            Almeja o nosso País ser um player na inovação em fármacos, segundo afirma(va)m especialistas na formulação das políticas públicas para Saúde. Para entrar neste seleto clube dos inventores de fármacos, precisamos, antes, inventá-los. O que não se pode fazer por medida provisória, nem decreto! Portanto não podemos prescindir de Químicos Medicinais! Aqueles propriamente ditos, com perfil de todas “aquelas” que mencionei arriba!

               Mãos à obra, o tempo urge: formemo-los! Para tanto precisamos preservar os conceitos da Química Medicinal, propriamente dita, empregá-los adequadamente, resistir aos modismos terminológicos criados exteriormente e que de fato nada acrescentam.
 
              Obrigado por lerem.