Esta postagem tratará de
documentar, ainda que de forma sumarizada, a história da Escola de Verão em
Química Farmacêutica Medicinal (EVQFM) que em 2013 chegará à sua décima nona
edição, ininterrupta desde 1995. Trata-se de registrar a motivação e criação
desta atividade de extensão, iniciada em 1995, pelo Laboratório de Avaliação e
Síntese de Substâncias Bioativas (LASSBioR, www.farmacia.ufrj.br/lassbio) da Universidade Federal do
Rio de Janeiro (UFRJ) que visa atualizar ou reciclar os conhecimentos em uma
disciplina essencial ao completo conhecimento dos efeitos dos fármacos e
medicamentos.
Preâmbulo – O surgimento da Química
Farmacêutica Medicinal
Cabe neste início relembrar
as origens da Química Farmacêutica
Medicinal e sua missão definida anos após pelo Subcommittee on Medicinal Chemistry and Drug Development da Chemistry
and Human Health Division (VII) da International
Union of Pure and Applied Chemistry (IUPAC)[1]
como: a disciplina que estuda os aspectos
relacionados à descoberta, invenção e preparação de substâncias bioativas,de
interesse terapêutico, e os fatores moleculares do modo de ação dos fármacos,
incluindo a compreensão da relação entre a estrutura química e a atividade (REA
ou SAR) terapêutica, absorção, distribuição, metabolismo, eliminação e
toxicidade.
Podemos dizer que a Química Farmacêutica Medicinal nasceu,
em 1911, no Instituto Pasteur, mais precisamente no Laboratoire de Chimie Thérapeutique, criado por Ernest Fourneau, sob
a direção de Emile Roux. Fundado com a missão de inventar substâncias de
interesse terapêutico, neste laboratório Fourneau contou com a colaboração de
eminentes cientistas da época como Jacques Tréfouël (1897-1977) e sua esposa Théreze
Tréfouël (1892-1978), além de Germaine Benoit (1901-1983), Federico Nitti
(1903-1947) e Daniel Bovet (1907-1992), que veio a ganhar o prêmio Nobel de
Medicina em 1957 pelo conjunto de seu trabalho realizado com as sulfonamidas,
anti-histamínicos e também com o curare. Data desta época, o primeiro trabalho
científico que pode ser considerado como tratando da relação entre a estrutura
química e a atividade, precisamente em derivados do curare amazônico, estudado
por Bovet.[2]
Neste laboratório, que se tornou referência da disciplina, foi descoberto o
stovarsol (TreparsolR, CAS 97-44-9) como um poderoso agente
anti-sífilis. Esta substância contém em
sua estrutura um átomo de arsênio oxigenado copiando o fósforo da mesma coluna
da Tabela Periódica. Ademais, possui também um grupo N-acetila de uma unidade orto-aminofenol
comprovando a tendência à acetilação, então em moda na química orgânica
preparativa da época.[3]
Curiosamente, à mesma época em que Bovet recebia a honraria máxima em Ciência,
o Professor Alfred Burger, da Universidade da Virginia nos Estados Unidos,
fundava pela American Chemical Society
o atual Journal of Medicinal Chemistry,
prestigioso periódico científico da área que surge com a denominação de Pharmaceutical Chemistry Journal, em 1958. O Professor Burger foi o idealizador do
livro “Principles of Medicinal Chemistry”, publicado em sua primeira edição
neste período e tratando pioneiramente os aspectos moleculares dos fármacos por
classe terapêutica. Da combinação das duas escolas, europeia e americana, surge
a denominação Química Farmacêutica ou Química Medicinal que no nosso país ficou
sendo denominada Química Farmacêutica
Medicinal, depois da publicação da “Carta de Goiânia”, elaborada no VII
Encontro Nacional de Professores de Química Farmacêutica, realizado na
Universidade Federal de Goiás. Considero que nossa denominação para esta
importante disciplina das Ciências Farmacêuticas é a mais adequada por
representar mais fielmente sua origem.
A Escola de Verão em Química Farmacêutica Medicinal (EVQFM)
Após estes dados históricos
iniciais, podemos introduzir os fatores que nos motivaram a criar a Escola de Verão em Química Farmacêutica
Medicinal, em 1995, no LASSBio
da Faculdade de Farmácia da UFRJ. Há muitos anos antes, por volta de 1970,
havia sido oferecida pelo Departamento de Química da Universidade Federal Rural
do Rio de Janeiro, organizada pelo saudoso Professor Otto Richard Gottlieb (1920-2011)
um evento denominado Escola de Verão em Química Orgânica. Nesta Escola, que
tive o privilégio de participar, às vésperas da conclusão de meu mestrado, em
1973, tinha duas semanas de duração e participaram estudantes, de graduação ou
de pós-graduação, com aulas sobre temas específicos, ministradas por especialistas
nacionais e internacionais. Por sua localização geográfica, em Serpédica, RJ, a
permanência nas dependências da UFRRJ propiciava aos participantes, contato em
tempo integral, o que contribuía para aproximação dos professores com os
estudantes. Esta iniciativa foi depois implantada, em 1981, no Departamento de
Química da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), catalisada pelo saudoso
Professor José Tércio Barbosa Ferreira (1952-1997), que também cursou a Escola
de Verão em Química Orgânica da UFRRJ e foi colega do narrador no mesmo
departamento onde este atuou após seu doutoramento, no período de 1980 e 1984,
quando foi criado o curso de pós-graduação em Química Orgânica da UFSCar.
O inconteste sucesso das Escolas de Verão em Química Orgânica, em dois momentos distintos, reafirmava sua importância e, por isso, após ingressarmos na Faculdade de Farmácia da UFRJ decidimos reeditar esta iniciativa desta feita voltada para a Química Farmacêutica Medicinal, aproveitando, de um lado o apelo da Cidade Maravilhosa no período de verão e o ócio acadêmico deste período do ano, quando as dependências físicas das IFES ficam subutilizados, durante as férias. Assim que, organizamos, durante o segundo semestre de 1994, a primeira edição da Escola de Verão em Química Farmacêutica Medicinal que ocorreu em janeiro de 1995, já com um formato semelhante ao atual, tendo como missão atualizar e capacitar estudantes de graduação e pós-graduação, assim como profissionais e pós-doutores em temas clássicos e modernos da Química Farmacêutica Medicinal através da oferta de cursos de curta duração, conferências de especialistas nacionais e estrangeiros, além de divulgação dos aspectos mais recentes da disciplina.
Na figura a seguir está uma cópia do memorando original enviado pelo coordenador à Direção da Faculdade de Farmácia da UFRJ, solicitando o encaminhamento de pedido de apoio financeiro à Fundação Universitária José Bonifácio e informando a criação da EVQFM que contou com o apoio do III Encontro Nacional de Professores de Química Farmacêutica realizado nas dependências da Faculdade de Farmácia da UFMG na avenida Olegário Maciel, em Belo Horizonte, MG.[4]
Desde aquela época até hoje, decorridos 19 anos, a EVQFM foi oferecida ininterruptamente propiciando a mais de 2200 participantes, nacionais ou não, estudantes de graduação e pós-graduação além de profissionais de diferentes profissões e pós-doutores, oportunidade de atualização com temas clássicos e modernos da Química Farmacêutica Medicinal. O sucesso desta iniciativa pode ser constatado pelos inúmeros profissionais que por adotarem a Química Medicinal, tornaram-se expoentes em suas atividades de docência, de pesquisa e outras relacionadas. Passaram pela EVQFM nestas quase 19 edições mais de 50 pesquisadores internacionais renomados, dentre os quais alguns “descobridores de fármacos” como Robin Ganellin (SK&F), inventor da cimetidina em 1975; Simon Campbell (Pfizer), inventor do sildenafil, em 1991; alem de Jean Cumps (Université de Louvain), Hugo Kubinyi (BASF), Antonio Monge (Universidad de Navarra), Camille Wermuth (Université Louis Pasteur), Mitch A Avery (University of Mississippi), Paul Leeson (Astra-Zeneca), Andy E Greene (Université Joseph Fourrier), Janos Fischer (Gideon), Hugo Cerecetto (Universidad de La Republica) dentre muitos outros.
O inconteste sucesso das Escolas de Verão em Química Orgânica, em dois momentos distintos, reafirmava sua importância e, por isso, após ingressarmos na Faculdade de Farmácia da UFRJ decidimos reeditar esta iniciativa desta feita voltada para a Química Farmacêutica Medicinal, aproveitando, de um lado o apelo da Cidade Maravilhosa no período de verão e o ócio acadêmico deste período do ano, quando as dependências físicas das IFES ficam subutilizados, durante as férias. Assim que, organizamos, durante o segundo semestre de 1994, a primeira edição da Escola de Verão em Química Farmacêutica Medicinal que ocorreu em janeiro de 1995, já com um formato semelhante ao atual, tendo como missão atualizar e capacitar estudantes de graduação e pós-graduação, assim como profissionais e pós-doutores em temas clássicos e modernos da Química Farmacêutica Medicinal através da oferta de cursos de curta duração, conferências de especialistas nacionais e estrangeiros, além de divulgação dos aspectos mais recentes da disciplina.
Na figura a seguir está uma cópia do memorando original enviado pelo coordenador à Direção da Faculdade de Farmácia da UFRJ, solicitando o encaminhamento de pedido de apoio financeiro à Fundação Universitária José Bonifácio e informando a criação da EVQFM que contou com o apoio do III Encontro Nacional de Professores de Química Farmacêutica realizado nas dependências da Faculdade de Farmácia da UFMG na avenida Olegário Maciel, em Belo Horizonte, MG.[4]
Desde aquela época até hoje, decorridos 19 anos, a EVQFM foi oferecida ininterruptamente propiciando a mais de 2200 participantes, nacionais ou não, estudantes de graduação e pós-graduação além de profissionais de diferentes profissões e pós-doutores, oportunidade de atualização com temas clássicos e modernos da Química Farmacêutica Medicinal. O sucesso desta iniciativa pode ser constatado pelos inúmeros profissionais que por adotarem a Química Medicinal, tornaram-se expoentes em suas atividades de docência, de pesquisa e outras relacionadas. Passaram pela EVQFM nestas quase 19 edições mais de 50 pesquisadores internacionais renomados, dentre os quais alguns “descobridores de fármacos” como Robin Ganellin (SK&F), inventor da cimetidina em 1975; Simon Campbell (Pfizer), inventor do sildenafil, em 1991; alem de Jean Cumps (Université de Louvain), Hugo Kubinyi (BASF), Antonio Monge (Universidad de Navarra), Camille Wermuth (Université Louis Pasteur), Mitch A Avery (University of Mississippi), Paul Leeson (Astra-Zeneca), Andy E Greene (Université Joseph Fourrier), Janos Fischer (Gideon), Hugo Cerecetto (Universidad de La Republica) dentre muitos outros.
Espero que esta leitura tenha sido prazeirosa e que possa ter sido registro, ainda que breve, da história da Escola de Verão em
Química Farmacêutica Medicinal que terá sua 19ª edição no período de 18-22 de
março de 2013 e para maiores informações sobre esta edição consultem: http://www.farmacia.ufrj.br/lassbio/xix_evqfm
Obrigado
por lerem.
[2] A Editora da UNB publicou
o livro “Vitórias da Química – Daniel
Bovet”, que descreve a trajetória científica deste pioneiro da Química
Farmacêutica Medicinal.
[3] Descrita em Eur. J. Med. Chem., 31, 747 (1996) e depois comentada em: a) C. R. Ganellin et al., Eur. J. Med. Chem. 35, 163 (2000); b) A Monge et al., Eur. J. Med. Chem.,
35, 1121, (2000)
[4] Cabe mencionar que o primeiro Encontro Nacional de Professores de Química Farmacêutica foi organizado pelo saudoso Professor Andrejus Korolkovas, da Faculdade de Ciências Farmacêuticas da Universidade de São Paulo, SP, em 1975.