Nesta nossa quadragésima quinta postagem vou
abordar um tema que deve assustar os Químicos Medicinais, propriamente ditos!
Cabe um preâmbulo que
explique a razão do título! Inúmeras regiões deste nosso Brasilzão têm crendices populares, que aguçaram nossa credulidade,
ampliaram nossos temas folclóricos e nos enriqueceram culturalmente. Algumas
relacionadas à sorte e muitíssimas outras a vários temas, inclusive à saúde.
Algumas mandingas tornaram-se clássicas e embrenharam-se pelas bandas da
superstição... A crença de que o 13 é um número de “azar” se opondo ao 7...pode
ser um simples exemplo. A existência do Curupira, que anda por aí..., por lá e
acolá; o uso do incenso como purificador e outras simpatias (Figura 1). Aquelas
relacionadas à saúde são ofício de curandeiros e benzedeiras, de extrema
riqueza em detalhes, mais ou menos distantes da razão, em certos casos.
Por
tudo isso me pareceu pertinente intitular o tema desta postagem como a “maldição de Wermuth”. Mas primeiro tenho
de apresentar-lhes o Professor Camile G. Wermuth.
Trata-se de eminente Químico
Medicinal francês, prestes a lançar a quarta edição da “Bíblia da Química Medicinal”,
no próximo mês: The practice of MedicinalChemistry - Fourth edition (Academic Press, ISBN 9780124172050). Criador
da Prestwick Co., em 1999, uma empresa de
Química Medicinal como se auto-intitula, “incubada” em Ilkirch, zona próxima ao
campus da Université de Strasbourg (antiga Université Louis
Pasteur), onde Wermuth trabalhou toda sua carreira científica na Faculté de
Pharmacie. Aquela universidade foi berço do trabalho de Nobelistas, alguns
próximos à Química Medicinal como o químico Jean-Marie Lehn, ganhador do Prêmio Nobel de
Química em 1987, aos 48 anos de idade, juntamente com Donald J. Cram
(1919-2001) da University of California, Los Angeles (UCLA) e Charles J. Pedersen (1904-1989) do
Massachusetts Institute of Technology (MIT).
Não nos esqueçamos que os pioneiros da Química Medicinal, Fischer e Ehrlich
trabalharam ali por perto de Estrasburgo, criando as bases do que denomino de
paradigma de Fischer & Ehrlich (vide postagem anterior neste blog). A
proximidade de Estrasburgo com a Basiléia permitiu, talvez pela presença de
inúmeros laboratórios de pesquisa em Química Medicinal pertencentes a várias
famosas empresas farmacêuticas (inter-alia
Sanofi Aventis, Roche, Novartis, Transgene, Lilly, Milipore) na área, ou
exatamente por isso, o status àquela região da Alsacia francesa de Polo Europeu
de Pesquisa de Novos Medicamentos (Pôle
Européen des Recherches en Medicaments), denominação criada no âmbito das
políticas de fortalecimento da competitividade industrial estratégica francesa.
Devemos a Wermuth
a invenção de importantes medicamentos neuroativos da classe dos derivados
aminopiridazinônicos, como a minaprina (CantorR), um dos principais
antidepressivos utilizados na França. Mas afinal, qual será a tal maldição mencionada no título? Em seu
livro, no prefácio
da terceira edição, ele afirma que nada de mais ruim pode acontecer
ao Químico Medicinal, propriamente dito, do que ter uma série de compostos, uma
autêntica série congênere de dezenas de compostos sintetizados arduamente,
completamente inativos ou impróprios! Como evitar esta “maldição”? Não será através de rezas, mandingas, nem crendices, mas
empregando correta e cuidadosamente as estratégias de desenho racional que a
Química Medicinal preconiza e nos ensina! Estas tem sido responsáveis pelos inúmeras
inovações terapêuticas de sucessos como o foram, muitos dos medicamentos
inventados no século 20 e utilizados até hoje! Por estas e por outras muitas razões
(e não são poucas!), a gestão da pesquisa farmacêutica visando a inovação
radical, como o faz o Químico Medicinal, propriamente dito, não é tarefa
simples e aos tesandos da área,
aconselho: de nada adianta “colecionar” 10, 20, 30 ou 40 novos compostos
sintéticos, ou mesmo mais do que isso, sem que os bioensaios necessários a
comprovarem suas atividades, estejam em plena sincronia com os esforços
sintéticos, senão o risco da maldição
aumenta e de nada adiantarão rezas ou amuletos, nem trabalhar na bancada número 7!
Saravá!
Obrigado por lerem.