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sexta-feira, 27 de dezembro de 2013

A descoberta do vemurafenibe, primeiro fármaco para o tratamento do melanoma metastático

     O tratamento do câncer representa ainda um desafio ainda a ser vencido sendo que os medicamentos oncolíticos representaram, em 2012, ca. 8-9% do mercado mundial de fármacos.
     Inúmeros tipos de câncer são motivo de profundos estudos desde há muito tempo, objetivando a compreensão de sua completa e complexa fisiopatologia. Avanços significativos vêm sendo realizados, como muitos propiciados pela farmacogenômica molecular, estudando o envolvimento de genes definidos nos estudos do genoma humano, com a expressão de proteínas oncogênicas, responsáveis ou co-adjuvantes na proliferação celular em determinados tipos de câncer.
      Em 2002, um enorme avanço foi obtido na compreensão da participação de RAF quinases (RAFK), sinalizadores celulares conhecidos há mais de 30 anos, da classe das serina-treonina quinases (STK), em vários tipos de câncer (Figura 1, B). Nos genes destas quinases, especialmente responsável pela isoforma BRAF – gene BRAF – foi identificada uma mutação específica na valina (V) 600 que mudava para um resíduo ácido glutâmico (E). Este gene V600E aumenta significativamente a atividade STK, promovendo intensa proliferação das células cancerosas. Esta mutação ocorre em pacientes com diversos tipos de câncer: coloretal, papilar e anaplástico da tireoide, ovários, células não-pequenas do pulmão, gastrointestinal, carcinoma hepático e melanomas, entre outros. Este conhecimento científico estimulou os estudos sobre o melanoma metastático que compreende um severo tipo de câncer com poucos recursos terapêuticos disponíveis. De acordo com dados do Instituto Nacional do Câncer dos EUA, a taxa de sobrevida em 5 anos, para este tipo de câncer é de aproximadamente 15%.
      Em 2011, houve a introdução dos primeiros novos fármacos para o tratamento do melanoma metastático, que apresentaram significativo benefício de sobrevivência em inúmeros pacientes.
     Alguns recursos empregados no controle deste tipo de câncer compreendem o uso da dacarbazina e altas doses de interleucina-2 (IL-2), ainda assim com baixo impacto terapêutico, não permitindo a resposta efetiva em muitos pacientes. Em abril de 2011, o ipilimumab (Yervoy R; Bristol -Myers Squibb ), biofármaco que atua como anticorpo monoclonal específico para antígeno 4 associado ao linfócito-T citotóxico humano (CTLA4) , foi lançado nos Estados Unidos e atingiu vendas de US$  40 milhões, nos EUA, que crescem ca. 54% ao ano, segundo dados do IMS Health. A ausência de fármacos para o tratamento do melanoma carcinostático estimulou a pesquisa nesta área que resultou no surgimento do vemurafenibe (ZelborafR ; Daiichi Sankyo / Roche, 2011). Este fármaco, de fórmula molecular C23H38ClFN2O3S, é uma pequena molécula inibidora da BRAF quinase, com peso molecular de 489,9 Da, ativo por via oral, aprovada para o mercado dos EUA em agosto de 2011, para o tratamento de pacientes diagnosticados com melanoma metastático com mutação BRAF-V600E positiva.
     Os custos do tratamento com o ZelborafR é de US$ 9.400/mês (ca. R$ 21600,00), o que corresponde a US$ 56.400 (ca. R$ 130.000,00)  para um tratamento padrão de 6 meses. Cabe registro, para comparação, que o mesmo tempo de tratamento com o YervoyR chega a US$ 120.000 (ca. R$ 276.000,00). Estes dados indicam o potencial de mercado do vemurafenibe com benefícios significativos no tratamento, evidenciando a vantagemdo uso de fármacos versus biofármacos.


     A estrutura química do vemurafenibe é extremamente simples, caracterizando-se pela presença do núcleo 7-azaindólico substituído (enquadrado em azul) por um ponto farmacofórico aceptor-H (C=O). A sua sub-unidade terminal é um fragmento n-propil-sulfonilamina (C3H7SO2NH- enquadrado em vermelho). O seu planejamento e desenho molecular é um ótimo exemplo do panorama da pesquisa científica contemporânea no processo de descoberta racional de novos fármacos, agregando conhecimentos de diferentes áreas como da biologia estrutural e molecular; da cristalografia de raios-X; da síntese orgânica; da bioquímica; da farmacologia molecular e clínica e da Química Medicinal.

     Considerando-se que o vemurafenibe ainda é um fármaco recente e que não se esgotaram as distintas e possíveis configurações de tratamento, especialmente quanto ao seu eventual emprego como coadjuvante em possíveis associações para tratamento de diferentes durações e doses, ajustados para cada paciente, seu perfil terapêutico pode ser considerado um promissor indicador do que poderá ser a medicina personalizada.
     A título de comentário final o nome vemurafenibe vem de: V, abreviação de valina; E abreviação de ácido glutâmico, ambos amino ácidos envolvidos na mutação que resultou no reconhecimento molecular da BRAF pelo fármaco; MU, de mutação; RAF da quinase alvo; ENIBE, adaptado de inibidor.
 
Ótimo Ano de 2014 a todos e a todas.
Obrigado por lerem.