A Química Medicinal tem observado
contínua evolução, beneficiando-se dos inúmeros avanços tecnológicos.
Interessante considerar-se sua transição, dos tempos do uso menos discriminado
de animais de laboratório, especialmente do rato Wistar, co-autor não explícito
de inúmeros papers, descrevendo inúmeras moléculas bioativas. Talvez não seja
exagero, considerar-se o rato Wistar como co-inventor de diversos blockbuster ao
longo das últimas décadas... En passant, lembro-me que a indometacina,
descrita em 1962 pelos laboratórios MS&D [TY Shen, The discovery of
indomethacin and the proliferation of NSAIDs, Seminars in Arthritis and
Rheumatism, 1982, 12, 89. doi 10.1016/0049-0172(82)90004-x] somente foi
descoberta porque Charles Winter e colaboradores [CA Winter, EA Risley, GW Nuss,
Antiinflammatory and antipyretic activities of
indomethacin, 1-(para-chlorobenzoly)-5-methoxy-2-methylindole-3-acetic
acid, J Pharmacol Exp Ther 1963, 141,
36997], desenvolveram o modelo do edema de pata de rato, induzido por
carragenina, utilizando ratos Wistar!!!
Levou-se algumas décadas para a
transição dos tempos dos ratos Wistar à estratégia de desenho molecular
baseados na estrutura do alvo terapêutico ou do seu ligante, as estratégias
descritas pelas modernas siglas: SBDD e LBDD!! Óbvio que esta transição
incorporou diversos avanços tecnológicos, alguns emprestados da Biologia
Estrutural, da evolução das técnicas de difração de raios-X, dependentes da
capacidade tecnológica dos equipamentos modernos, entre outros. Não houvéssemos
desenvolvido habilidades de manipulação de estruturas proteicas complexas,
entendendo seu papel em diversas fisiopatologias, inclusive crônicas,
multifatoriais, nunca teríamos dado este salto a partir do Wistar até os dias
da SBDD & LBDD!!Atualmente, não nos soa nem um pouco estranho, qualificar-se alguns padrões moleculares como “privileged scaffold” ou “privileged structures” com definições amplas em demasia, no meu ponto de vista! Aliás, cabe registro, a incrível “evolução” das publicações que tratam do papel dos grupos funcionais (os mais diversos) na Química Medicinal. Não são poucos os papers que descrevem a importância das hidroxilas, dos grupos nitro, do F etc... Até parece que, de repente, muitos pesquisadores “acordaram” para a importância destes registros.... e os grupos funcionais entraram no cardápio das “novidades” da Química Medicinal, embora já existissem há inúmeras - põem inúmeras nisso - décadas, senão vejamos: inter-alia - K-D Wu et al., Acrylamide Functional Group Incorporation..., ACS Med. Chem. Lett. 2019, 10, 22; Y Pae, The Dark Side of Fluorine, ACS Med. Chem. Lett. 2019, 10, 1016; J Cramer et al., Hydroxyl Groups in Synthetic and Natural-Product-Derived Therapeutics: A Perspective on a Common Functional Group J. Med. Chem. 2019, 62, 000; DOI: 10.1021/acs.jmedchem.9b00179]...!!
Recentemente, escrevi com dois dos meus melhores alunos de pós-graduação, Julia Galvez B. Pedreira (PPGQu, UFRJ) e Lucas S. Franco (PPGFQM< ICB-UFRJ), um paper tratando da intuição química, dos químicos medicinais, no processo de “Drug Design and Discovery”... Se quiserem conferir: Chemical Intuition in Drug Design and Discovery, Curr. Top. Med. Chem. 2019. Neste paper, fizemos uma abordagem cronológica separando “termos clássicos” dos “termos modernos” da Química Medicinal, mais ou menos como “nos tempos do rato Wistar” até SBDD & LBDD! Não esqueçam que descobria-se fármacos de grande relevância terapêutica e mercadológica “nos tempos do rato Wistar”....
Obrigado por lerem.