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sexta-feira, 19 de agosto de 2011

Docência e Decência

No final do século XI surge a primeira universidade no mundo, precisamente em Bologna, Itália. No início do século seguinte nasce a Universidade de Paris e em seguida a Universidade de Oxford, primeira da Inglaterra a ser criada, em 1096. No século XII nasce a Universidade de Salamanca, primeira espanhola, e a primeira portuguesa aparece em Coimbra no final do século XIII. Observa-se, ao longo dos séculos seguintes a criação de várias outras na Europa e América, em sua maioria vinculadas à Igreja.
A Université de Grenoble, onde me doutorei em 1978, surge neste período, precisamente em 1369, seguindo-se a de Heildeberg (1386), enquanto que a primeira universidade americana foi criada no século XVI em Lima, a Universidad Nacional Mayor de San Marcos, fundada em 1551. No Brasil a primeira universidade nasce com a denominação de Faculdade de Medicina da Bahia, em 1808, que foi incorporada a atual Universidade Federal da Bahia em 1946.
Estes dados indicam que nossas universidades são bem jovens, comparadas com aquelas pioneiras. Mesmo assim, ainda que em processo de amadurecimento, nossas universidades atingiram espantosa produtividade com a capacidade de graduar milhões de estudantes em diversas áreas do conhecimento. Não há nenhuma dúvida sobre a excelente contribuição dada ao desenvolvimento humano por estas instituições no mundo, sendo inúmeras suas fantásticas descobertas que beneficiaram sem número de seres humanos, em todos os cantos da Terra.
Surgiu, em meados do século XIX, nosso sistema formal de pós-graduação que, em tempo recorde consolidou-se, atingindo no fim da primeira década do século XXI a impressionante marca de titular mais de 12000 doutores e 47000 mestres/ano, em praticamente, todas as áreas do conhecimento, contribuindo vivamente para que atingíssemos o excelente índice de produtividade científica, responsável por 2,4% do conhecimento novo planetário, “falando” nosso idioma e colocando-nos em 13º lugar no mundo. Não foram atingidas estas invejáveis marcas, sem trabalho e dedicação de todos aqueles profissionais e estudantes universitários, sempre pautados na precisa e rigorosa liturgia acadêmica, norteada pelo mérito e avaliada pelos pares. Ainda não aprendemos todos os passos deste ritual acadêmico e muitas vezes o atropelamos, talvez por excesso de passionalidade e insuficiente autocrítica, entendendo mais a título pessoal do que devíamos as justas e oportunas críticas que caracterizam a vida verdadeiramente acadêmica de uma instituição universitária, que quando não são feitas pelo próprio, o serão por seus pares, legitimamente motivados pela defesa dos princípios, da liturgia e dos ritos acadêmicos que asseguram a imprescindível credibilidade da meritocracia essencial à vida universitária. Há de se haver extrema atenção na universidade, especialmente, mas não somente, pelos professores, principais espelhos inspiradores dos futuros valores humanos de seus discípulos, na defesa intransigente dos valores éticos em todas suas atividades e deliberações universitárias. Estes espelhos não devem ter lesões, nem manchas, pois sem a lógica da coerência não é possível inspirar valores éticos na juventude. Devemos assegurar, sempre, o exercício da docência de qualidade, com decência e probidade, pois senão estaremos confundindo o exercício da legitimidade com a ética e sabemos todos que nem tudo que é legítimo é ético, assim como a ausência de avisos de proibido não significa que tudo nos seja permitido. A defesa da universidade de qualidade no Brasil passa por aí e todos os eventuais equívocos cometidos nos serão debitados na conta da lisura, da seriedade do rito e da liturgia acadêmica, inegociáveis sob todas e quaisquer circunstâncias sob pena de ferirmos nossa imagem institucional e nunca mais recuperarmos a credibilidade, certamente para sempre perdida.
Eliezer J. Barreiro
Professor Titular – UFRJ

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