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domingo, 19 de julho de 2015

Como evitar-se a “maldição de Wermuth” na Química Medicinal


Nesta nossa quadragésima quinta postagem vou abordar um tema que deve assustar os Químicos Medicinais, propriamente ditos!

Cabe um preâmbulo que explique a razão do título! Inúmeras regiões deste nosso Brasilzão têm crendices populares, que aguçaram nossa credulidade, ampliaram nossos temas folclóricos e nos enriqueceram culturalmente. Algumas relacionadas à sorte e muitíssimas outras a vários temas, inclusive à saúde. Algumas mandingas tornaram-se clássicas e embrenharam-se pelas bandas da superstição... A crença de que o 13 é um número de “azar” se opondo ao 7...pode ser um simples exemplo. A existência do Curupira, que anda por aí..., por lá e acolá; o uso do incenso como purificador e outras simpatias (Figura 1). Aquelas relacionadas à saúde são ofício de curandeiros e benzedeiras, de extrema riqueza em detalhes, mais ou menos distantes da razão, em certos casos.
 
 
     Por tudo isso me pareceu pertinente intitular o tema desta postagem como a “maldição de Wermuth”. Mas primeiro tenho de apresentar-lhes o Professor Camile G. Wermuth.
Trata-se de eminente Químico Medicinal francês, prestes a lançar a quarta edição da “Bíblia da Química Medicinal”, no próximo mês: The practice of MedicinalChemistry - Fourth edition (Academic Press, ISBN 9780124172050). Criador da Prestwick Co., em 1999, uma empresa de Química Medicinal como se auto-intitula, “incubada” em Ilkirch, zona próxima ao campus da Université de Strasbourg (antiga Université Louis Pasteur), onde Wermuth trabalhou toda sua carreira científica na Faculté de Pharmacie. Aquela universidade foi berço do trabalho de Nobelistas, alguns próximos à Química Medicinal como o químico Jean-Marie Lehn, ganhador do Prêmio Nobel de Química em 1987, aos 48 anos de idade, juntamente com Donald J. Cram (1919-2001) da University of California, Los Angeles (UCLA) e Charles J. Pedersen (1904-1989) do Massachusetts Institute of Technology (MIT). Não nos esqueçamos que os pioneiros da Química Medicinal, Fischer e Ehrlich trabalharam ali por perto de Estrasburgo, criando as bases do que denomino de paradigma de Fischer & Ehrlich (vide postagem anterior neste blog). A proximidade de Estrasburgo com a Basiléia permitiu, talvez pela presença de inúmeros laboratórios de pesquisa em Química Medicinal pertencentes a várias famosas empresas farmacêuticas (inter-alia Sanofi Aventis, Roche, Novartis, Transgene, Lilly, Milipore) na área, ou exatamente por isso, o status àquela região da Alsacia francesa de Polo Europeu de Pesquisa de Novos Medicamentos (Pôle Européen des Recherches en Medicaments), denominação criada no âmbito das políticas de fortalecimento da competitividade industrial estratégica francesa.
Devemos a Wermuth a invenção de importantes medicamentos neuroativos da classe dos derivados aminopiridazinônicos, como a minaprina (CantorR), um dos principais antidepressivos utilizados na França. Mas afinal, qual será a tal maldição mencionada no título? Em seu livro, no prefácio da terceira edição, ele afirma que nada de mais ruim pode acontecer ao Químico Medicinal, propriamente dito, do que ter uma série de compostos, uma autêntica série congênere de dezenas de compostos sintetizados arduamente, completamente inativos ou impróprios! Como evitar esta “maldição”? Não será através de rezas, mandingas, nem crendices, mas empregando correta e cuidadosamente as estratégias de desenho racional que a Química Medicinal preconiza e nos ensina! Estas tem sido responsáveis pelos inúmeras inovações terapêuticas de sucessos como o foram, muitos dos medicamentos inventados no século 20 e utilizados até hoje! Por estas e por outras muitas razões (e não são poucas!), a gestão da pesquisa farmacêutica visando a inovação radical, como o faz o Químico Medicinal, propriamente dito, não é tarefa simples e aos tesandos da área, aconselho: de nada adianta “colecionar” 10, 20, 30 ou 40 novos compostos sintéticos, ou mesmo mais do que isso, sem que os bioensaios necessários a comprovarem suas atividades, estejam em plena sincronia com os esforços sintéticos, senão o risco da maldição aumenta e de nada adiantarão rezas ou amuletos, nem trabalhar na bancada  número 7!
      Saravá!

Obrigado por lerem.